Bader parece ainda não saber muito bem que sua vida mudou. Aposentado há quase três meses, o pastor alemão de sete anos e meio trabalhava como farejador da Polícia Federal no aeroporto de Guarulhos e não hesita em cheirar tudo o que vê pela frente.
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Cabo Clóvis de Souza e a recém-aposentada cadela Dara, do Corpo de Bombeiros
Ele agora vive em uma casa com bastante terra e espaço para ser explorado em Mairiporã (Grande São Paulo), onde fica com os outros cachorros do agente Marcelo Teodoro Alves, o ex-parceiro de trabalho que virou seu dono.
Beatriz Toledo/Folha Imagem
Pastor alemão Bader deixou a Polícia Federal e atualmente aproveita a piscina do dono, Marcelo Teodoro, nos dias de sol.
É praxe nos canis da Polícia Federal e do Corpo de Bombeiros: assim que um cachorro de trabalho chega à idade de se aposentar --por volta de sete anos--, o seu parceiro humano tem a prioridade para levá-lo para a vida de bicho de estimação. Se isso não é possível, pode indicar alguém apto à adoção.
"A gente cria amor pelo bicho", diz Teodoro. "Nem passou pela minha cabeça não ficar com o Bader." O agente adora relembrar os feitos do cão, que já encontrou droga camuflada até dentro de tanque de gasolina.
A mania de continuar farejando e ter um comportamento meio agitado são normais nos cães de trabalho aposentados, em especial nos primeiros meses, quando estão em período de adaptação.
"Esses animais passam por treinamentos intensos durante toda a vida, além de situações de estresse constantes. Tanto que cães farejadores ficam com os pêlos do focinho esbranquiçados mais cedo. É por isso que, na aposentadoria, as polícias tentam encaminhar sempre para o parceiro com quem ele está acostumado. Isso minimiza os efeitos da mudança", avalia o tenente Aristides Maganin Junior, veterinário do canil central da Polícia Militar de São Paulo.
Beatriz Toledo/Folha Imagem
Para Thabata, a labradora preta do sargento Everaldo Gomes, do 1º Grupamento do Corpo de Bombeiros da Capital, o mais difícil foi entender que ele iria voltar para casa. A cadela via seu tutor fardado e chorava desesperada, não dormia até ele retornar do trabalho. Hoje, depois de um ano e meio de aposentadoria, ela já aprendeu a curtir todas as benesses de viver com uma família, ao lado de crianças. E sabe que Everaldo não a abandonará.
O sargento conta que ficou chateado porque, bem na semana em que ela foi castrada para morar com ele, em janeiro de 2007, ocorreu o acidente do metrô, quando as obras da futura estação Pinheiros da Linha Amarela desabaram. "E eu não pude levar minha cachorra para ajudar a Dara e a Anny", diz, citando as duas cadelas que se tornaram heroínas das grandes tragédias paulistanas do ano passado: além do acidente do metrô, a queda do avião da TAM, em julho.
Dara e Anny se aposentaram no mês passado. As duas também ficaram com seus condutores: os cabos Clóvis de Souza e Maximiliano Panagassi, respectivamente. No começo, elas provavelmente sentirão falta da movimentação do quartel e até do treinamento rígido. Mas, com o tempo, dizem os especialistas, vão se habituar à nova rotina. Que o diga Bader. Agora, ele descobriu prazeres como se jogar na piscina do dono em um belo dia de sol.
O caminho da aposentadoria
- Pode ser por alguma doença ou por falta de adaptação ao serviço. Fora isso, os cães se recolhem entre os sete e os oito anos de vida
- Parceiros de trabalho têm prioridade na hora da adoção ou na indicação de alguém para ficar com o bicho
- Cães da Polícia Federal voltam para o canil central em Brasília, passam por avaliações veterinárias e castração, e só então é dada a baixa de patrimônio (eles deixam de ser do Estado). Se não houver indicações internas, qualquer pessoa que demonstrar interesse pode adotar o animal
- No caso do Corpo de Bombeiros, a castração é uma opção do novo dono. Existe um termo de doação e de responsabilidade que o Estado e o novo dono assinam. Se houver comprovação de maus-tratos ou atos ilícitos, o Estado pode reaver o animal
Fontes: Aristides Maganin Junior (Polícia Militar de São Paulo), Clóvis de Souza (1º Grupamento dos Bombeiros de São Paulo) e Marcelo Teodoro Alves (Polícia Federal)
CÍNTIA MARCUCCI
da Revista da Folha
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