quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Defesa dos animais

O circo é uma das artes mais antigas do mundo e por onde passa atrai crianças e adultos. Ao longo dos anos os espetáculos ganharam números mais elaborados e arriscados. Hoje tem também o chamado Novo Circo, movimento que prioriza a dança e o teatro nas apresentações.


Apesar das novidades, palhaços, acrobatas e malabaristas ainda são os preferidos do público e, quase sempre, esses artistas dividem o palco com animais. Os shows com bichos são quase tão antigos quanto o próprio circo mas já não fazem o mesmo sucesso de antigamente. "Não é conveniente, primeiro porque tem os maus tratos e segundo, ele pode se soltar e causar dano", afirma uma moradora de Brasília. "Está certo que dá alegria pra gente. Mas pra eles é um sofrimento. Não adianta nada dá alegria pra gente e pra eles ser sofrimento", completa outra brasiliense.

A resistência à presença de animais nos espetáculos não parte apenas do público. As entidades de proteção aos animais defendem o fim dessa prática em espetáculos circenses. O estresse provocado pelas constantes viagens e a falta de estrutura dos circos são apontados como problemas graves. Mas eles não são os únicos. Para a diretora da Associação Protetora dos Animais do Distrito Federal (Proanima– DF), Marina Corbucci, nada supera o esquema de adestramento. "Os treinamentos são rigorosos, cruéis e envolvem punição para que eles apresentem comportamentos anti-naturais da espécie", avalia Marina.

O movimento ganha força à medida em que aparecem episódios de maus-tratos. Um deles chamou a atenção do Ibama. O analista ambiental Anderson Valle vistoriou o Le Cirque, em Brasília e diz que encontrou os animais em condições precárias. Cada um dos seis elefantes vivia num espaço equivalente ao de uma quitinete. As girafas, mais altas que a tenda, ficavam praticamente todo o tempo com o pescoço encolhido.

Mas para o fiscal, um hipopótamo exótico e dois chimpanzés eram as maiores vítimas do descaso. "Quando nós sedamos o chimpanzé, verificamos no pescoço cicatrizes em cima de cicatrizes provocadas por ferimentos da corrente que o proprietário usa para levar o animal para passear. Sem contar o fato de que todos os dentes do animal foram arrancados para que ele não mordesse num momento de estresse. Do recinto do hipopótamo, nós retiramos quase um metro de altura de fezes", contabiliza Valle.

O Le Cirque foi multado em R$ 28 mil e teve os macacos e o hipopótamo apreendidos. O proprietário, George Stevanovich, não se conforma com as penalidades e nega que os animais sejam maltratados. "Nós temos veterinário responsável, gastamos 2,5 toneladas por dia de alimentação.. Para mim, mau trato é a falta de água, de alimentação, deixar o animal ficar no sol", declara Stevanovich, que levou a briga para a justiça.

"Nós não podemos admitir que um analista do Ibama conclua em laudo que não considera a presença de animais em circo adequada. Quem tem que definir normas, legislar é o legislador", diz o advogado Luiz Saboya, que defende o Le Cirque. Mas para o Tribunal Regional Federal da primeira região, onde o processo está tramitando, não há segurança para o circo retomar as apresentações com animais enquanto existir a suspeita de maus tratos.

Maltratar, ferir, mutilar um animal é crime contra o meio ambiente e o agressor pode ser punido com até um ano de cadeia. As punições estão previstas em lei federal. O que ainda não foi regulamentada é a exibição de animais em circo. No Congresso Nacional, está em tramitação um projeto que prevê a proibição de uma vez por todas desse tipo de apresentação. Se a proposta for aprovada, macacos, girafas e elefantes só poderão ser vistos nos zoológicos. Para o diretor do Zoológico de Brasília, Raul Gonzalez, a medida representaria muito mais segurança para animais e visitantes. "Já imaginou no meio do espetáculo, um elefante estressado sai do picadeiro? A única coisa que eles talvez poderiam fazer, dependendo da autorização, é abater o animal. No zoológico, é diferente, eles têm seus próprios recintos, tem vários veterinários, zootecnistas e uma equipe multidisciplinar com toda uma estrutura voltada para nosso maior patrimônio, que são os bichos", diz Gonzalez.

Apesar de serem crescentes as propostas e as chances de mudança, o espetáculo não deve ficar menos interessante. Para Marina Corbucci, tudo é uma questão de hábito. "Circo é lugar de artista e não de animais. É lugar de enaltecermos a criatividade humana e não a crueldade cometida contra animais", resume.

Esta matéria foi exibida no Via Legal 317 em 01/10/2008.

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