Vamos pensar um pouco sobre isso:
Antes de falarmos da remuneração é importante deixar claro que um captador de recursos é um profissional de marketing. Como um gerente de marketing que planeja as formas de crescimento da instituição em termos de ganho em recursos e de forma institucional.
A diferença é que um gerente de marketing recebe no segundo setor uma verba para administrar de forma a multiplicar as vendas e os clientes, fideliza-los e criar campanhas de conquista de mercado, e o captador de recursos do terceiro setor não tem essa verba, precisa além de executar e planejar essas ações, captar os recursos para fazer com que aconteçam.
Existem várias maneiras no Brasil de remuneração do profissional de captação de recursos:
* Salário fixo
* Salário fixo + comissão
* Salário fixo + prêmio
* Comissão
* Remuneração por hora trabalhada
* Remuneração por hora trabalhada + comissão
Entende-se por salário fixo um valor acordado entre as partes para remuneração mensal do profissional com um registro em CLT ou através de contratação de autônomo, e que este captador tenha um contrato de trabalho para exercer sua função em um número de horas previamente acordado.
Entende-se por comissão um percentual do total bruto ou líquido (depende do acordo entre ambas as partes) que será repassado ao captador. Este percentual varia de 2% a 20%. Tal percentual pode englobar também a elaboração do projeto ou até mesmo o trabalho de acompanhamento do projeto já em execução.
Entende-se por prêmio, um valor estipulado pelo contratante que é pago se o captador atingir determinada meta em sua captação.
Entende-se por hora-trabalhada, o tempo que o profissional dedica para o cliente, seja elaborando projetos, seja visitando o cliente, seja prestando contas.
Todas essas formas de remuneração são legais, deve-se escolher a mais adequada à condição de sua ONG e claro, acordada com o profissional.
A maneira mais recomendada para ONGs, tendo em vista que a captação de recursos é considerada o CORAÇÃO da instituição (ver artigo - Captação de Recursos), é que se comece com uma pessoa fixa que se dedique integralmente à atividade e dê início a um departamento profissional de captação de recursos.
Antes de aprofundarmos, é preciso entender que estamos aqui falando de um PROFISSIONAL. Não é um amigo que vai lhe fazer um favor, tão pouco alguém que tem pena de você e da sua ONG e da sua situação amadora. É um profissional que entende do mercado, que estudou para isso, que tem experiência no assunto, histórias de sucesso e feeling apurado.
O comissionamento é a remuneração mais discutida e que gera polêmica no setor. O "porquê" realmente não entendo, pois não vejo nenhum objetivo ou argumento concreto que justifique essa aflição de alguns no mercado diante da chamada COMISSÃO.
Já li matérias onde COMISSÃO é tratada como se fosse pecado. Pecado é montar uma ONG para ganhar dinheiro. Pecado é utilizar de forma ineficiente o dinheiro do doador. Pecado é sair passando o chapéu como se fosse um mendigo implorando um trocado pra sua ONg nção fechar. Pecado é não ter recursos para capacitar seus funcionários, é ser injusto na remuneração dos mesmos com a DESCULPA de que no terceiro setor os PROFISSIONAIS devem ganhar menos.
Infelizmente verificamos que ter um captador de recursos e - ou uma área de captação de recursos e marketing é considerada ainda um luxo para várias instituições do Terceiro Setor. É incrível como uma instituição deixa em último lugar no seu check-list de crescimento, a área que é responsável por sua sobrevivência como se fosse algo supérfluo. E infelzmente muitas já nascem sem essa visão e acabam por correr atrás de um profissional da área APENAS quando se está no vermelho ou fechando as portas por falta de recursos.
Escutamos muitas delas dizendo: "Não posso contratar um captador de recursos, é muito caro... Se ele trabalhasse só por comissão nós podíamos ter um, mas encontrar alguém que aceite esta proposta está tão difícil.”
Encontramos aí dois pontos interessantes: “Muito caro”, ou seja, é mais um salário fixo, mais impostos, mais custos. “Difícil encontrar”, ou seja, os captadores não querem só comissão, pois não existe garantia em captação de recursos, mas mesmo sem garantias, existem custos, existem horas que serão gastas de seu tempo. Como assessoria de imprensa. Não existem garantias. Existe credibilidade e claro, relatórios de trabalho que comprovem resultados, ou ao menos tentativas. E se não existe esse começo, mesmo que de insucessos, não se saberá nunca onde se está falhando. O fracasso deve ser encarado com uma benção, quase uma consultoria, que diz onde você está errando. Importante lembrar que um trabalho PROFISSIONAL de captação de recursos acontece de médio a longo prazo e EXIGE planejamento antes de tudo.
Outro ponto: Os serviços assistenciais e de proteção devem ser sérios e profissionais na organização, o de captação de recursos não foge à regra. E a contabilidade? Quer dizer que uma empresa especializada em telefone celular não pode ter um contador especializado só porque sua missão não é fazer bem contabilidade? E uma ONG que cuida de baleias brancas por exemplo, não pode remunerar um especialista em direito por não ter em sua missão a melhor aplicação das leis? E serviços profissionais devem custar, não?
Sem hipocrisias, o captador de recursos deve ganhar dinheiro através do seu sucesso, certo? E o que seria esse sucesso? Recursos captados para projetos, campanhas de marketing social, novos sócios mantenedores, doações esporádicas, planejamento de captação de recursos, fidelização de atuais doadores, busca de novas oportunidades no mercado.
Será que ele é um profissional como todos os outros, que tem que pagar contas de água, luz, moradia, alimentação, carro, gasolina, vestir-se bem, fazer sua higiene, sustentar talvez um filho, um parente próximo, será que ele pode pegar um cineminha de vez em quando ou jantar fora no aniversário da mãe?
Ele precisa e deve cobrar. Cmo qualquer PROFISSIONAL. É sua profissão, séria, idônea, comprometida. Tudo custa. Ele pode até desenvolver um trabalho voluntário, mas sem receber de nenhum cliente ficaria muito difícil, a não ser que alguma ONG internacional quisesse pagar este salário para ele.
Comissão não deve ser encarada como um negócio sujo, muito pelo contrário. Pautada em bom senso, comum acordo, transparência e justiça, não existem problemas. A Lei Rouanet prevê o comissionamento do captador. Ah! Cultura não é social, claro que é, está dentro de qualquer causa social, inclusive, porque sem cultura não se faz nada bem feito.
Para garantir sua credibilidade, podemos então utilizar do bom senso, do senso de justiça e da transparência e estipular um teto de percentuais. Porque quem trabalha tem o direito de receber por isso. E por que não por comissionamento?
Não vamos confundir comprometimento com comissão, missão com comissão, como se fosse um negócio imoral. Comprometimento com a causa, sem dúvida, deve existir e existirá se houver afinidade, profissionalismo e seriedade tanto na ONG como no captador de recursos. Cabe aqui avaliarmos o que é comprometimento e não confundir com remuneração por trabalho. Ambos, mesmo diferentes, deveriam andar juntos.
Comissionamento pode até ser usado por alguns consultores como desculpa de comprometimento, argumentando que a culpa é do patrocinador que se souber que um centavinho foi utilizado para remunerar o captador, não patrocina mais. O que fazer? Esconder do patrocinador então? Claro que não, pelo contrário, devemos ser cada vez mais transparentes.
Cabe aqui um bom exemplo: vendedores ganham em sua maioria salário + comissão (não estou aqui dizendo que captador é vendedor, estou apenas fazendo uma comparação). O consumidor que compra do vendedor sabe que no valor que ele está pagando por uma televisão naquela loja, está embutida a comissão dele. E nem por isso deixa de comprar. Quer dizer agora que vamos ficar avaliando aonde cada centavo da TV vai, e se avaliarmos, e chegarmos a conclusão de que aquele dinheiro não foi direto para seu fabricante, não compramos?
Em marketing aprendemos o processo de como estipular um preço. Neste valor, muitas coisas estão embutidas, senão a organização e - ou negócio não sobrevive. Num projeto social, todo o orçamento deve estar detalhado e demonstrando - "o que" custa "tanto", "quando" e "como" e "para quê", e dessa maneira o patrocinador sabe para onde vai cada centavo, desde salários, impostos, equipamentos, etc. Se ele souber então que parte vai para impostos, decide não patrocinar? O que é isso? Pode ser por questões internas, pode. Por conta de regimento interno? Pode. Por uma série de fatores, mas pode ser por falta de comprometimento e hipocrisia.
Comprometimento deve haver dos dois lados. Uma empresa deixa de patrocinar um projeto social porque sabe que 5% será o comissionamento do captador, por exemplo. Uma pena e uma grande hipocrisia.
Deixamos então de patrocinar um projeto que ajudará milhares de crianças por causa de um ganho de um captador profissional que ajudou na elaboração de um projeto com suas horas, que prospectou no mercado possíveis doadores, que usou sua gasolina, seu telefone, seu estudo, sua roupa, seu tempo? Queremos ganhar, queremos serviços profissionais e bem feitos, mas não queremos pagar por isso?
E depois escuto: "Toda ONG e empresa devem ter sua responsabilidade social..." Responsabilidade social também é ser justo com nossos fornecedores, funcionários e parceiros, saber dividir lucros e remunear quem trabalhou.
Mas devemos também entender que comissionamento é
legalmente considerado como salário. E, infelizmente no Brasil, é difícil
encontrarmos real comprometimento sem recebimentos. Quem já não ouviu a famosa frase de que “o barato sai caro”? Simples, por falta de comprometimento.
Temos que entender de uma vez por todas que só vamos crescer sendo profissionais. Profissional recebe pelo seu trabalho, que deve ser transparente, sério e eficiente. Para ser transparente, sério e eficiente precisa de estudo, de experiência prática, de reciclagem, de tecnologia, de comunicação.
Fazer uma faculdade no Brasil, sabemos, não é fácil. Não estou falando da faculdade paga, nem dos que estudaram em escolas particulares a
vida toda, até porque aqui estamos falando de ONGs. Ah! Ótimo ponto. ONGs devem ser de segunda mão então? Claro que não. Todos devemos ser profissionais naquilo que fazemos, e as ONGs devem ter um contador especializado sim, um captador especializado sim.
E aí entramos na “cultura da mendiguez” porque é mais fácil mendigar. Ser profissional é muito caro.
Fazer cursos, estudar inglês, escrever projetos então, nem me fale. Sobram recursos anualmente em Ministérios e Secretarias por falta de projeto bem escrito. E mesmo assim não querem remunerar um profissional que tenha essa rara habilidade.
Daqui podemos tirar nossas próprias conclusões à resistência da profissionalização do terceiro setor por parte de algumas ONGs.
Hipocrisia é o que menos precisamos neste momento. Nosso país, nossas ONGS, nossos projetos, todos precisamos de informação e de se preocupar com seus afazeres e objetivos, ao invés de ficar se preocupando com o que os outros ganham por seus serviços.
Vamos ser profissionais, com a paixão que existe no Terceiro Setor, com a pessoalidade saudável de um setor público, mas em primeiro lugar com o profissionalismo e a seriedade do segundo setor.
Fernanda Dearo é sócia-diretora da DEARO Captação de Recursos e Marketing Social, consultora de captação de recursos e marketing, palestrante e ministrante de cursos na área em todo Brasil.
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